segunda-feira, 6 de outubro de 2008

Ajudar os outros


Por: António Centeio
Se as pessoas não são capazes de ter força suficiente para aguentar a passagem da tempestade como poderão valorizar as mudanças interiores que tantas vezes são necessárias para o que desejam tenha outro significado? Foi isto que sempre faltou a Mariana fazendo com que a sua vida como os seus sonhos por pouco não se concretizassem.
A vida bem cedo lhe abriu as portas a toda a espécie de contrariedades que só acontecem a quem não sabe que a vida -como as ondas do mar – tanto sobe como desce.
Passou a ter como companhia os dissabores do infortúnio para exclamar constantemente que a “
vida nada de bom
” lhe tem dado. O caminho da sua desalinhada e pobre personalidade como do ambiente em que foi criada contribuiu para que quase tudo viesse ter com ela.
Quando já se encontrava à muito no «fundo da vala» foi quando viu o brilho de uma estrela que no Céu iluminava quem mais parecia um farrapo que um ser humano. Sentiu no seu interior que «lá de cima» qualquer coisa lhe iria acontecer – para o bem ou para o mal.
Para quem teve como companheira habitual a aspereza da vida é difícil acreditar nos sinais que muitas vezes se escondem por detrás de uma estrela. A sua voz interior disse-lhe «
o que sentiste foi algo que nem todos podem ver ou aceitar como uma verdade».
Foi quando se lembrou que tinha sido uma estrela que encaminhou os reis magos no caminho para Belém.
A sua alma sorriu enquanto seu corpo se arrepiava. Pela primeira vez na sua vida – cheia de mazelas – sentiu como teve a noção que tinha ouvido algo que até à data julgava não ser possível a não ser que
«fosse mais uma partida do destino».
Se até sentiu um arrepio porque não acreditar? Lembrou-se: «antes da tempestade o Vento costuma avisar as pessoas para se recolherem».
Cinquenta anos. Como companhia o contrário daquilo que sempre sonhou. Ter uma aranha ou um ratazão como companhia para ela era coisas mais que suficientes para voltar as costas de vergonha a quem de igual julgava ser.
Nas manhãs frias em que até o Sol parecia nada querer com ela ou de tão pouco lhe fazer companhia sentava-se em cima da verdura que lhe servia de lençol olhando para o vale que na sua frente convivia de espanto com a natureza. Esta combinação era o contraste do que sentia – dentro nas suas profundezas de ser humano que era – mexendo na sua dor e recordando-lhe as agruras da vida que eram as suas melhores companhias. Quando a bola de fogo descia a sua alma falava-lhe para lhe dizer que estava triste e que devia plantar frutos na terra para que conseguisse mudar as coisas.
Muitas vezes quando olhava para a estrada que ficava tão distante mas ao mesmo tempo tão perto costumava ver as pessoas vestidas de negro ou de cinzento acompanhando o carro que no seu interior levava algo rodeado de flores.
Nestes momentos olhava singelamente para o horizonte e pensava: «
às vezes o mundo troca as voltas às pessoas ou ….. as pessoas não sabem trocar as voltas ao mundo
».
Até os passarinhos olhavam para ela e viam os seus olhos turvos e a fronte enrugada com marcas profundas de sofrimento pensando ao mesmo tempo que a continuar assim, um dia a sua alma iria depenar no desconhecido para depois ficarem sem a companhia de quem já sabia e conhecia o significado dos seus chilreares.
Às vezes temos as coisas na nossa frente e não as vemos. São nestes momentos de descuido que a vida nos passa ao lado. Se as vermos então encontraremos o nosso caminho que nos levará à busca da razão de viver. É este o sublime momento de sabermos suportar a passagem da tempestade.
Mariana sabia que o «brilho» lhe queria dizer qualquer coisa. «
Que quererá o brilho dizer, que tormento me espera depois de viver constantemente no meio da turbulência?»
perguntava a si própria.
“Oh mortalidade porque não me buscas? Chamo-te para junto de mim e nunca ouves as minhas palavras. Deixa-me ir para junto de ti. Lembra-te de mim!” eram
as palavras que costumava gritar quando a raiva explodia dentro do seu ser.
Despedaçada interiormente pelo que era, sabia que o seu futuro continuava ameaçado. Foi quando no silêncio do vale e no barulho do silêncio ouviu
uma voz dizendo-lhe «Inicia agora o teu percurso porque a noite é apenas uma parte do dia e acredita na tua fé porque estiveste mergulhada tempo demais na escuridão. Ergue a tua cabeça e não desprezes a tua personalidade. Sê tu mesmo! Nunca mais deixes de ouvir a tua voz interior e conhece os sinais que a vida te vai dar para nunca mais dizeres que nunca os vistes».
Com o que ouviu e com a confiança que ganhou em si própria mergulhou na noite escura atravessando a floresta que a separava da estrada.
Mariana soube construir ao longo do tempo um
mundo muito especial
para aqueles a quem a vida nunca tinha sorrido. «O mundo está sempre em mutação» dizia.
Soube construir estruturas para que aos mais desfavorecidos nada falte como soube ensinar as pessoas a ajudarem-se a si mesmas. Mandou plantar campos floridos e campos de trigo para que nas noites de luar possa ver na obra que fez e na companhia dos que mais precisam «
os sinais que costumam estar no brilho das estrelas».
Para ti Mariana que hoje és uma grande mulher e que estás ao lado dos mais desfavorecidos escrevi estas palavras. Dei-te o privilégio de as leres antes de serem publicadas. Teus olhos não ficaram turvos como quando os passarinhos olhavam para ti mas senti a tua alma sorrir. Mais não são do que um singelo resumo da tua vida passada.
O teu presente ao “
mundo dou a conhecer”. Quanto ao futuro como tu gostas de dizer «logo se verá
».
Mais tarde ou mais cedo havemo-nos de encontrar no «
caminho das estrelas
». Todos os dias te vejo porque estás na minha memória.
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