quarta-feira, 28 de maio de 2008

Gabriel, um trabalhador acusado de assaltante





Por: António Centeio

É, e sempre foi um trabalhador exemplar – nunca gostou que lhe chamassem empregado. Ainda o patrão, não chegou à Fábrica dos Pirolitos e já aguarda a abertura dos portões para poder entrar.
É sempre o primeiro a comparecer na enorme extensão que nas horas de movimento acolhem as camionetas que descarregam e voltam a carregar o vasilhame daquilo que beberam e que outros irão consumir.
Sempre gostou de ser o primeiro a entrar para ser o último a sair mesmo que algumas vezes o patrão lhe tenha que pedir para se retirar porque quer fechar o que abriu.
- Desculpe senhor Alfredo mas a minha máquina tem que ficar como um brinquinho.
Todos o estimam e admiram pela sua entrega e dedicação à fabriqueta, não isentando que não haja este ou aquele que nas suas costas diga mal de quem não prejudica ninguém.
Talvez seja aquele trabalhador que todos os patrões gostariam de ter. Cá fora, da fábrica, todos o conhecem como o apreciam por se preocupar com tudo e todos.
- Então vizinha, a sua Mariazinha está melhor? Estas malditas gripes! Não desanime que melhores dias virão.
Se sabe dalguma desgraça, vai logo perguntar se é preciso alguma coisa.
- Não se esqueça se o seu marido precisar de sangue, quando for operado, estou pronto a dar do meu».
Quando a sua vizinha do terceiro sentiu as dores de parto, foi ele que a levou para o hospital de madrugada – o marido estava num curso qualquer de formação. Desapareciam as estrelas do Céu e já regressava na sua velha carripana, do tempo da guerra a caminho da Fábrica Peninsular de Pirolitos.
Bela dia, estava a trabalhar quando um agente de autoridade compareceu na dita, notificando-o para se apresentar na esquadra.
- Eu, ir à esquadra? Mas não fiz nada!
O polícia que o conhecia, disse-lhe para não se enervar que tudo se resolveria a contento. Com a breca, isto é que não estava previsto. «Notificado para ir à polícia?» Não pode ser verdade!
Para quem anda dentro das esteiras devia ser coisa complicada ou então algum engano.
- C’um raio!...Não te preocupes filho duma zíngara, não há-de ser nada de grave, disse o patrão para lhe acrescentar – cá estarei para te ajudar a desfazer esse enredo. Não te conhecesse há um carradão de anos; agora como te conheço, descansa que até vou contigo para sossegares.
A chefe da esquadra, por acaso uma bela moçoila, que até sempre viveu no bairro do agora notificado, conhecia como ninguém o Gabriel, daqui esta burocracia, mais não ser que um mau entendido, vinda de outras bandas.
- Sente-se ali naquele cadeira, vizinho Gabriel, para de seguida puxar por um enorme calhamaço:
- Diz aqui, que a sua viatura participou num assalto a uma ourivesaria lá para os lados do Algarve! Claro que isto mais não é do que uma enorme confusão, mas das grandes, atirou-lhe como informação a graduada.
O pobre Gabriel, quando ouviu o conteúdo do averbamento até mudou de cor ao ouvir do que era acusado.
- O meu carro? Mas não pode ser verdade, senhora chefe!
- Ó vizinho deixe-se lá dessas coisas e trate-me como sempre tratou. Qual chefe qual carapuça. Vizinha e acabou.
Apresentado o relatório, cedo se verificou que algum amigo do alheio, falsificou a matrícula do carro dos larápios. O azar calhou ao Gabriel.
Como um relâmpago, resolveu-se logo a questão.
- Gabriel, que o seu patrão entregue fotocópias do boletim de ponto e que faça uma declaração em como no tal dia esteve a trabalhar.
Chamado que foi o patrão, mais disse:
- Ainda provo mais: trago a gravação da máquina que filma a entrada e saída dos carros na minha própria fábrica; lá, tem que estar de certeza absoluta, o do Gabriel.
No fim do dia estava desfeito o equívoco e desvendado a causa da notificação, acrescida na resposta, de um apêndice em que a entendida fazia ver por A mais B que tudo não passava de uma esperteza usual de quem anda no gamanço.
- Irra! Que ninguém pode dizer que está bem, desabafou Gabriel quando viu o auto encerrado. Há dias que um homem não pode sair de casa.
Isto é que se riu o empregador, abraçando o empregado, enquanto lhe dizia:
- Vai para casa descansar que hoje já tiveste a tua parte e, de que maneira!...


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