Por: António Centeio
Estranho é este homem, o Tobias, de hábitos e outras coisas. Levanta-se pela madrugada com o salpicar do Sol para antes de se sentar ao computador ir à cozinha buscar o cinzeiro como o resto dos cigarros que ficaram da noite, que ainda é noite, passando de seguida pela sala para se servir da sua primeira, ou última aguardente velha do dia ou da noite. Começa então a escrever no monitor prosas vindas dos confins da sua mente, ou sei lá donde, como que fosse a sua primeira necessidade básica do dia.
Ainda remeloso, já o monitor fumega por todo o lado por causa do fumo dos cigarros, fazendo com que as paredes da divisão estejam todas amarelas, como o seu velho bigode ainda está mais amarelo que tudo que o rodeia.
Não permite a ninguém (só lhe resta uma prima afastada e a velha Silvina, antiga ama e actual criada. A poucas pessoas, faculta a entrada, excepto escritores, que deixa enxergar alguns escritos ou deles quer saber opiniões) que entre na sua divisão sem a sua permissão ou presença, salvo a pessoa deste escriba, em que Tobias confia plenamente, já que ajuda quando pode e atura os seus desabafos ou pedidos sobre o que há-de ou não escrever.
Não o satisfaço apenas nas horas que inicia o seu trabalho como no que bebe e fuma, mesmo sendo obrigado a inalar o fumo daquela coisa mal cheirosa. Sendo resmungão como resmungões são aqueles que precisam de solidão para escrever compreende-me para ao mesmo tempo dar-me razão e, fazer-me a vontade.
Pelas prateleiras e espalhado pelo chão, milhares de livros, todos desarrumados ou ainda por catalogar, que me compete a mim, na qualidade de confidente aprendiz da arte de prosar. Aqui, pequenos apontamentos com anotações, livros abertos esperando por alguém que os leia; acolá, blocos com frases obtidas algures e enxertos do arco-da-velha.
Deita-se quando deveria almoçar, levanta-se quando deveria estar a jantar; alimenta-se de frutos secos, para raramente, sair dos aposentos e ir a alguma restaurante das proximidades. O madrugador incita-me a que, com ele, ande ou o aconselhe a visitar ou frequentar locais solitários para que a inspiração não o abandone.
Foi numa destas visitas que encontramos o “Solar dos Girões”. Depois, de termos percorrido “seca-e-meca e olivais de Santarém” para sabermos quem eram os donos, a fim de obtermos a devida autorização para o visitar, conseguimos num ápice de tempo a respectiva autorização. Ficou deslumbrado com o que viu – eu também. O “Solar dos Girões” situa-se na localidade de “Carril” terra centrada no coração do Ribatejo em plena região vinícola. Tem mais ou menos sete hectares que aglomera: habitação jardins, quintais, pátios e uma pequena área rural onde existe uma mina de água, uma fonte, um tanque de rega e ainda uma zona rústica constituída por uma área de prados e por uma mata de sobreiros, alguns de grande porte. Existem ainda magnólias, árvores já centenárias. Em volta do edifício, propriamente dito, longos canteiros de hortenses embelezam a habitação, fazendo com que nas manhãs quentes, quando se abra a janela, se inale o aroma que das roxas flores vem. Entre a parte traseira do edifício e o quintal, um forte carvalho
Passados poucos meses, com artes e manhas – de um bom negociante, coisa que eu desconhecia em Tobias, conseguiu dar a volta ao proprietário e comprar o mesmo.
Adora estar até às tantas sentado na secretária, escrevendo à luz do candeeiro aquilo que a inspiração lhe dita. Noutras alturas, senta-se no seu velho cadeirão olhando para as sombras do velho carvalho.
Tobias, como quase todos os escritores, tem destes devaneios, porque: mais do que os vulgos, sentem numa forma muito especial, que os percursos que fazem na vida têm um caminho final. Não é por acaso que está bem escarrapachada na sua secretária, em itálico, a sua frase preferida: «Após a morte, todos nos encontraremos no caminho das estrelas».
Ainda remeloso, já o monitor fumega por todo o lado por causa do fumo dos cigarros, fazendo com que as paredes da divisão estejam todas amarelas, como o seu velho bigode ainda está mais amarelo que tudo que o rodeia.
Não permite a ninguém (só lhe resta uma prima afastada e a velha Silvina, antiga ama e actual criada. A poucas pessoas, faculta a entrada, excepto escritores, que deixa enxergar alguns escritos ou deles quer saber opiniões) que entre na sua divisão sem a sua permissão ou presença, salvo a pessoa deste escriba, em que Tobias confia plenamente, já que ajuda quando pode e atura os seus desabafos ou pedidos sobre o que há-de ou não escrever.
Não o satisfaço apenas nas horas que inicia o seu trabalho como no que bebe e fuma, mesmo sendo obrigado a inalar o fumo daquela coisa mal cheirosa. Sendo resmungão como resmungões são aqueles que precisam de solidão para escrever compreende-me para ao mesmo tempo dar-me razão e, fazer-me a vontade.
Pelas prateleiras e espalhado pelo chão, milhares de livros, todos desarrumados ou ainda por catalogar, que me compete a mim, na qualidade de confidente aprendiz da arte de prosar. Aqui, pequenos apontamentos com anotações, livros abertos esperando por alguém que os leia; acolá, blocos com frases obtidas algures e enxertos do arco-da-velha.
Deita-se quando deveria almoçar, levanta-se quando deveria estar a jantar; alimenta-se de frutos secos, para raramente, sair dos aposentos e ir a alguma restaurante das proximidades. O madrugador incita-me a que, com ele, ande ou o aconselhe a visitar ou frequentar locais solitários para que a inspiração não o abandone.
Foi numa destas visitas que encontramos o “Solar dos Girões”. Depois, de termos percorrido “seca-e-meca e olivais de Santarém” para sabermos quem eram os donos, a fim de obtermos a devida autorização para o visitar, conseguimos num ápice de tempo a respectiva autorização. Ficou deslumbrado com o que viu – eu também. O “Solar dos Girões” situa-se na localidade de “Carril” terra centrada no coração do Ribatejo em plena região vinícola. Tem mais ou menos sete hectares que aglomera: habitação jardins, quintais, pátios e uma pequena área rural onde existe uma mina de água, uma fonte, um tanque de rega e ainda uma zona rústica constituída por uma área de prados e por uma mata de sobreiros, alguns de grande porte. Existem ainda magnólias, árvores já centenárias. Em volta do edifício, propriamente dito, longos canteiros de hortenses embelezam a habitação, fazendo com que nas manhãs quentes, quando se abra a janela, se inale o aroma que das roxas flores vem. Entre a parte traseira do edifício e o quintal, um forte carvalho
Passados poucos meses, com artes e manhas – de um bom negociante, coisa que eu desconhecia em Tobias, conseguiu dar a volta ao proprietário e comprar o mesmo.
Adora estar até às tantas sentado na secretária, escrevendo à luz do candeeiro aquilo que a inspiração lhe dita. Noutras alturas, senta-se no seu velho cadeirão olhando para as sombras do velho carvalho.
Tobias, como quase todos os escritores, tem destes devaneios, porque: mais do que os vulgos, sentem numa forma muito especial, que os percursos que fazem na vida têm um caminho final. Não é por acaso que está bem escarrapachada na sua secretária, em itálico, a sua frase preferida: «Após a morte, todos nos encontraremos no caminho das estrelas».